A morte de Deus e a agonia da literatura

Gabriel Guimarães

Resumo


A noção de «morte de Deus» proposta por Nietzsche deu lugar a uma curiosa alucinação na cultura ocidental. De facto, várias crises religiosas, que podemos considerar como «mortes de Deus», ocorreram durante o Renascimento, o Barroco ou o complexo século XVIII — muito antes do advento do filósofo alemão —, mortes de imagens e conceções do ser sagrado que podemos escutar nas vozes de autores dessas épocas. Aquilo que Nietzsche defende, no fim de contas, é uma incineração do cadáver divino: um fim absoluto dessa presença
na cultura ocidental. Verificamos, porém, que Deus volta a ressuscitar, mesmo depois da mensagem do autor de Assim Falava Zaratustra. Contudo, após cada um destes renasceres, a sua presença na tapeçaria cultural do Ocidente torna-se mais ténue, mais esbatida, sendo que a atual agonia do conceito de «literatura», visível no mercado editorial, parece ter muito a ver com esta erosão do conceito de divino, da noção de transcendência, nas nossas sociedades. De facto, a «literatura» perfilou-se em boa parte como uma espiritualidade laica, que precisa de uma ideia forte e mais abrangente de transcendência para poder continuar a existir.


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